Por Daniela Fonseca*
As reflexões aqui discorridas se propõem a trazer para o debate sobre a possibilidade de lacunas que a não presença dos professores podem marcar na infância.A importância desta imagem na educação infantil, na vida das criança, ou seja, o papel desse ator social na formação humana que se dá pela mediação.
Destaco a escrita da frase “não presença”, por defender que para esta relação só há presença como pressuposto. É um exercício de manter a palavra e tudo que ela carrega em seus sentidos e significados. Presença dos sujeitos na relação de ensino e aprendizagem.
Saudade é uma palavra que não existe em (certos idiomas). E com isso o sentido e significado da palavra também não existem. É aquela máxima, o que os olhos não veem o coração não sente. Será? Para esse exercício de analogia, proponho um exercício de imaginação em que a imagem dos professores fosse apagada da relação.
As discussões atuais sobre a educação presencial e não presencial têm feito parte do cenário. E de tantas possibilidades de discussões, uma pergunta a qual devemos nos debruçar é: como seria um mundo sem a presença de professores?
Quero mudar o português arbitrário: Como seria um mundo sem a presença das professoras?
O papel deste "ator social" é indispensável para a formação humana em várias dimensões, sejam elas, afetiva, intelectual, emocional, cognitiva ou estética. Essas dimensões todas que são formadas nas crianças, se dá partir da relação presencial com um profissional, que tem em sua formação bases teóricas que o fundamentam, que dão ferramentas para que possam aproximar as crianças de forma qualificada aos conhecimentos acumulados historicamente.
A presença dos professores na infância tem um papel social nevrálgico para a formação humana, pois tem como pressupostos a relação social e educação integral. Diante e a partir disso quais lacunas a não presença dos professores pode acarretar na vida criança, nessa etapa da vida que é a infância?
Os professores aproximam as crianças das mais diversas leituras de mundo. Aproximam a criança do mundo de uma forma a qual foram preparados, formados para tal. Muitas famílias perguntam a esses profissionais: como conseguem lidar com tantas crianças o dia inteiro em uma sala?
A resposta é muito simples: é a partir de estudo, muito estudo, de uma preparação e aperfeiçoamento contínuo. Os professores precisam sempre estar buscando aprender mais, aperfeiçoar-se mais. É a formação continuada.
O que pode não estar em evidencia para quem não faz parte desse contexto é que a aparente bagunça de uma sala de educação infantil, (aparente porque diante dos moldes aos quais fomos ensinados a aceitar como ideal, espera-se uma certa ordem), tem ontogêneses, sócio gêneses e micro gêneses, que somente o trabalho, ou seja, a presença dos professores e sua mediação pelas vias da ampliação e da interpretação, podem com seus olhares sensíveis perceber e qualificar a vivência das crianças.
A formação de qualidade é que dá os aportes necessários, ou seja, as concepções teóricas e termos específicos da área, como: conceito de criança; conceito de infância; conceito de qual é o papel social da escola; conceito de sociedade; conceito das áreas de conhecimento, com aportes da pedagogia, assim como da psicologia, da sociologia, da antropologia e da filosofia e etc. São muitas as ciências, áreas de conhecimento, que dão a formação base e formação continuada aos professores.
É esta preparação que dá os elementos para fazer a aproximação, a mediação entre as leituras de mundo às crianças.
A mediação do conhecimento historicamente acumulado para as criança da educação infantil se dá de forma não conteudista. E esta é a grande sacada, digamos assim, dos professores da educação infantil, ou seja, é mediar noções conceituais de áreas do conhecimento, a matemática, por exemplo, por moldes diferentes do ensino fundamental.
A aproximação e mediação de uma noção conceitual de matemática, para continuar nessa ciência, se dão pelas sutilezas que acontecem por diversos caminhos não conteudistas, não limitados ou demarcados.
Pode ser a partir de uma de uma pergunta que surge em uma brincadeira, ou de uma curiosidade no refeitório, ou uma situação nas relações com os pares e etc. Além de estarem perpassados nos planejamentos.
Nos anos iniciais e no ensino médio, ou seja, outras modalidades da educação básica, a matriz curricular permite ter uma base específica, exige uma ordem a seguir cronológica dos conteúdos a serem aprendidos pelas crianças.
Para ensinar a leitura e a escrita, alfabetizar, por exemplo, há metodologias, ferramentas que te dão suportes, ou então, para ensinar o conceito de multiplicação existem meios e ferramentas, modelos, materiais, que dão direcionamento para ensinar.
Na educação infantil estes conceitos, ou melhor, as noções conceituais são atravessadas, perpassadas nas vivências do dia-a-dia nas relações sociais do educar e cuidar torna-se mais ampla e ao mesmo tempo sútil. É nessa dinâmica que vai sendo mediado as interpretações de mundo às crianças.
São nas sutilezas e olhares sensíveis dos professores que os elementos vão sendo trazidos, apresentados, evidenciados, visibilizados, problematizados e ampliados em pequenas perguntas (que são grandes perguntas). Nas interpretações e possibilidades de leitura que os professores mostram acerca da realidade as crianças vão formando também suas interpretações e leituras. Há uma relação dialógica!
E é a partir desta relação que as crianças vão formando, vão construindo, vão se apropriando do mundo que as cerca. Começam a interpretar o mundo que vivem, a problematizá-lo também. É uma formação basilar para a vida!
Essas bases formativas são fundamentais ainda, para a etapa seguinte da vida escolar. Quando a criança chega à escola para aprender de forma sistemática, tendo tido a oportunidade de passar por uma educação infantil de qualidade, assim como aqui de Florianópolis, terá muitos elementos ricos, ouse já menos lacunas para esse tempo e espaço tão desafiador.
São memórias, vivências de cheiros, imagens, sons, palavras, toques que movimentam seus aprendizados e desenvolvem as várias dimensões de formação humana, seja afetiva, intelectual, emocional, discursiva, de autonomia. Assim como diversas interpretações e leituras de mundo. Ato criador, imaginação. São ferramentas fundamentais para as bases humanas, que lhes darão segurança, reconhecimento, pertencimento para sentirem-se também produtoras e constituidora da cultura.
A não presença dos professores de Educação Infantil na vida das crianças, nesta etapa tão importante que é a infância, pode produzir-se em uma lacuna, uma não memória nas mais diversas e sutis vivências do dia-a-dia.
Uma lacuna que podemos destacar de forma imediata é um apagamento da imagem dos professores. A imagem dos professores na história humana como a conhecemos é recente, começa a forjar-se com o advento da educação em massa. E tem produzido na relação professores/aluno/criança, saltos qualitativos nas gerações, por seu papel estrutural.
A defesa aqui empreendida é que essa relação se dá com o corpo, com a presença, com a imagem, com um ideário até.
Professoras e professores são na estrutura da formação humana personagens que pela sua forma e conteúdo os caminhos pelos quais a vida foi e está a constituir-se.
Conta a história humana para as crianças com qualificação para tal. As crianças por sua vez, através de seus sentidos e significados interpretam, problematizam e podem ter garantidos os elementos básicos para iniciarem as suas produções. Terão em seus caminhos mais capacidade e memórias formativas, que pode em grande medida estar representada em seus professores.
Até a próxima reflexão.
Autora: Daniela Fonseca
*Daniela Fonseca Gonçalves
Professora e Mestre em Educação Linha Educação e Infância/UFSC
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