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Crônica: Manhã dos encapuzados

Atualizado: 22 de ago.

Por Ana D´Avila*


Todos indistintamente usavam capuz. Acima de roupas quentes e do nariz, gélido de frio. A moça da bicicleta também. Eram 7 horas da manhã.  Acima  um sol abrandando a temperatura. Estava frio. Mas as pessoas não deixavam de se exercitar. Uns corriam em rush pela Beira Mar. Outros pedalavam suas bicicletas de cores vivas e o mar roncava. Como sempre. Alienado e transparente.



O pequeno jardim tinha plantas de aspecto seco. E no resto da grama em frente a casa, pássaros. Muitos pássaros tipicos da região. Eles desfilavam em bandos. Na busca de alimentos sobrevoavam o mar à noite e ,pela manhã, a praça.Um quero-quero assustado deu uma rasante, enquanto um rapaz de moto e encapuzado circulava próximo. Talvez trabalhasse com entregas, de alimento e remédios.


Nos apartamentos ,solidão e a ingestão de álcool  e soníferos. Parecendo que ali todos sofriam do mal do século: angústia. As pessoas se escondiam de seus problemas mundanos com doses de remédios para dormir e controlar os nervos e as mentes vazias de alguma verdade.            A maioria das mulheres do lugar eram viúvas, carentes, sofridas. Os poucos homens eram divorciados, separados, aturdidos. Quem tentasse uma nova aproximação, por certo sofreria.Então, a solidão imperava.


A multidão de encapuzados dava um ar sinistro às ruas e não raro, causavam medo.Em meio aos sofrimentos existenciais também existiam pessoas especiais. Elas criavam, pintavam telas, escreviam e tentavam fazer teatro. Era a consciência cultural amenizando aquele ar todo de sofrimentos e desencontros.


As fisionomias das pessoas que viviam ali era de tristeza e preocupaçao. E nem o ar puro do mar colocava sorrisos em suas faces, agora escondidas por capuz.


Disfarçando ou encobrindo problemas a maioria das pessoas, naquela manhã de frio se encapuzaram. Formavam uma expressiva tribo difícil de entender. Talvez fosse frio. Talvez fosse medo. Ou quem sabe uma moda praiana. Pensei nisto toda manhã  acompanhando de perto seus estilos. Tão arte. Tão necessários.E, tão culturalmente iguais.


Texto publicado originalmente no veículo de comunicação: https://www.diariodeviamao.com.br/ana-davila-manha-dos-encapuzados/


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*Ana D'Avila

Jornalista, cronista e poetisa.


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